“RETALIAÇÃO” - COMO FOI O “PSICODRAMA EM ATO” DO DIA 24/04/2018


Vieram poucas pessoas. Porém, pessoas bastante dispostas a mergulharem no psicodrama. Este é uma vivência psicoterapêutica, na qual trabalha-se questões afetivas, relacionais, profissionais etc. de forma coletiva e psicodramática. O que isso significa? Que dramatizamos as questões. Uma pessoa traz a sua história e escolhe pessoas da plateia para representarem papéis relacionados à sua cena.
Como estávamos em poucas pessoas, pudemos conhecer um pouco do que cada um fazia profissionalmente e porquê estavam nesse psicodrama. Umas estavam por curiosidade e outras já tinham vivido a experiência e gostariam de reviver. Fizemos um jogo para que as pessoas adivinhassem características pessoais minhas (algumas me surpreenderam). Disseram que eu sou organizada, metódica, dura, “natureba”, como pra caramba, gosto de porcarias gastronômicas (como bacon), que sou uma mãe dura e uma delas disse que sentiu medo de mim a primeira vez que me viu falar. Não vou contar o que acertaram e o que não acertaram. Quem vier na próxima ficará sabendo! rsrs
Dessa vez optei por um aquecimento de caminhada e experimentação de várias formas de caminhar pelo espaço (rápido, devagar, pulando num pé só, no próprio ritmo de cada um...). As pessoas deveriam olhar umas nos olhos das outras e perceberem como estavam se sentindo ao fazerem isso. Em pensamento e em silêncio, recapitulamos um pouco da semana, como cada um estava se sentindo e o que gostariam de trabalhar (mesmo não trazendo a situação para o grupo), selecionando, então, uma cena que estivesse mobilizando emoções. Em dupla e trio, dividiram essas cenas com a outra pessoa.
Tivemos duas candidatas a trabalharem suas histórias: a primeira, a quem chamarei Meire, trouxe uma cena da sua relação com seu ex-marido, que não enviava dinheiro para a pensão da filha deles. A segunda, a quem chamarei Renata, trouxe uma questão com seu jeito de ser (muito duro e exigente) com os outros e a sua cena tinha relação com o trabalho.
A cena escolhida foi a de Meire e o nome é “Retaliação”. A cena começa com um diálogo entre Meire e seu ex-marido, Carlos (representado por uma pessoa da plateia). Este foi embora para outro país enquanto ainda estavam casados. Estão separados há, aproximadamente, 18 anos. A questão de Meire é que seu ex não dá dinheiro para ajudar na educação da filha, hoje com 22 anos de idade. M. começa a pedir dinheiro a ele, que se recusa e diz que já tem outra família nesse outro país. A discussão continua e vou invertendo os papéis durante o diálogo. Em um dos momentos em que M. toma o lugar de Carlos, ele diz que não dá dinheiro para mostrar poder e para que ela não se cuide, não compre roupas e não faça as coisas que ela gosta. Parece que a discussão não sai do lugar, então peço para ela colocar alguém no seu lugar e ela ver a cena de fora (em espelho). De fora, ela acha que ele ainda tem sentimentos por ela e que ele está muito infeliz. Os representantes (egos-auxiliares), com liberdade de expressão, potencializam o que está acontecendo na cena.
Peço, então, que M. molde o casal como numa escultura mostrando como era a relação deles quando eram casados. Ela coloca um de frente pro outro, cada um com as mãos para cima como quem recebe, mas diz que às vezes a relação não ficava boa, pois brigavam por causa do dinheiro que ele não trazia. Ela coloca cada um virado para o lado oposto. Peço para os representantes darem movimento e colocarem voz nos movimentos. Na maioria das vezes aparecia M. como a pessoa que cobrava muito.
Peço para que, no papel de C., M. modele a escultura do casal novamente. As posições são parecidas, porém ele fala muito do desconforto dele em ser cobrado o tempo todo pela esposa. Os egos-auxiliares dão movimento e fala para o casal.
Peço para M. escolher alguém para desempenhar o papel de sua filha, então com 3 anos e meio de idade. A menina entra no meio do casal e vai se sentindo perdida, não entendendo porque seus pais estão brigando. Sabe que é por causa de dinheiro, mas não entende. Coloco M. no lugar da filha e solicito ao casal que potencialize a briga e peço para M. perceber como se sente nesse lugar. Ela começa a ficar assustada e diz que a briga é por causa dela. Noto que M., no papel de sua filha, começa a se retrair e mudar sua expressão. (O que me faz pensar que talvez ela esteja se identificando com a sua filha.) Peço a ela que feche os olhos, perceba o que está sentindo e ver se ela lembra de alguma cena de sua vida a partir dessa sensação. Ela demora um pouco, mas sua expressão vai mudando e ela começa a chorar. Digo que ela não precisa trazer essa cena, se ela não quiser. E para se sentir à vontade para parar.
Ela quer dar andamento e traz a cena de quando ela tinha 3 anos e meio de idade e está no velório de seu pai, com muitas pessoas falando ao mesmo tempo. Uma parte dela quer ficar para não se separar do pai e outra parte dela quer ir embora, mas se sente desamparada, pois sente que não tem ninguém que lhe dê conforto.
Pergunto se tem coisas que ela gostaria de falar com seu pai. Ela diz que sim. Chamo uma pessoa da plateia para representar seu pai e dispenso os outros egos-auxiliares. Meire começa a falar os momentos em que ela sentiu falta dele, inclusive na parte financeira, quando gostaria que alguém lhe desse esse suporte. Conta sobre uma doença que desenvolveu logo após a morte de seu pai, a internação de sua mãe por 1 ano e meio, como se sentiu abandonada ao ter que ficar com os avós... Vou fazendo perguntas provocativas na tentativa de extrair emoções reprimidas e ela acaba trazendo a raiva que sentiu de seu pai por ele ter ido embora, por tê-la abandonado e por ter faltado nos momentos em que sentiu perdida: esses momentos acima mencionados, a primeira separação, a segunda separação e agora, no momento atual. Ela pede desculpas por sentir raiva dele.
A ego-auxiliar que representa seu pai vai expressando corporalmente suas sensações, ajudando no contrapapel em relação à fala de M. dizendo que está com sensações ruins porque a filha não está bem.
Quando percebo que a fala de M. esvaziou, peço para ela trocar de lugar com seu pai e pergunto como ele se sente ao ouvir tudo isso que a filha está dizendo. Ela, no papel de pai, diz que não sabia que ela estava assim, que ele a acompanha esse tempo todo e que gostaria que ela tomasse rumo na vida, encontrasse seu caminho, se cuidasse.
Quando troca novamente de lugar, ela diz que não sabe que caminho seguir e que gostaria que ele estivesse aqui para orientá-la. Ela pergunta o que ele quer fazer. Inverto novamente de lugar e pergunto a ela, no papel de seu pai, o que ele sente vontade de fazer, se movimentando em direção à sua filha e dando um abraço nela. Peço que eles invertam de papel e que ela receba o abraço de seu pai. Chamo outras pessoas da plateia para amplificarem o abraço, dizendo que ela fique o tempo que achar necessário recebendo o abraço. Seu corpo vai ficando mais relaxado e em um momento ela vai soltando de seu pai.
Volto para a cena inicial, coloco-a diante de seu ex-marido e pergunto o que ela sente por ele agora e peço para ela posicioná-lo conforme o que ela está sentindo. Ela diz que ele pode se afastar um pouco. O ego, no papel de seu ex-marido, vai se afastando lentamente e digo a ela para que avise quando estiver bom pra ela. Uns passos depois ela diz que está bom nessa distância. Ela já não sente mais tanta necessidade de pedir dinheiro a ele. Inverto as posições para ela, no papel dele, dizer que está sentindo. Ele quer ficar um pouco mais próximo, diz que vai ajudar, mas interpelo dizendo que isso não é real. Questiono sobre o que ele realmente pensa dessa situação. Ele diz que ela tem que tocar a vida dela, fazer as coisas que ela gosta. Como ela não sabe o que gosta, peço autorização para ela deixá-lo ir embora e chamo ela mesma para as duas terem uma conversa de Meire com Meire. As duas começam a questionar sobre as escolhas que fizeram na vida e o desejo de cuidarem de si e fazerem coisas para si. M. começa a relembrar o que gosta de fazer e como gostaria de se cuidar. Na busca por uma âncora, pergunto quem na vida dela pode dar um apoio a ela. Não tem ninguém, então pergunto se ela cuida dela mesma. Ela diz que sim. Incentivo que as duas formem um pacto de compromisso de que uma vai cuidar da outra. Elas selam o trato.
Abro o círculo para o compartilhamento e cada pessoa conta como se viu na história de Meire. Cada um diz uma palavra de como está saindo dali e agradecemos à Meire pelo presente de ter trazido sua história nesse espaço.

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