“MÃE PREJUDICA VIDA DA FILHA”, PSICODRAMA EM ATO DO DIA 26/06/2018


Eu sei que ficou faltando um post da série sobre relacionamentos, porém, como aconteceu o Psicodrama em Ato no dia 26/06, eu prefiro contar como foi e depois eu volto com o texto sobre “separação”.
Eu sempre digo que devem vir aquelas pessoas que precisam se encontrar naquele momento. No Psicodrama, esse fenômeno se chama “coinconsciente”. E, dessa vez não foi diferente. Três pessoas tinham a mesma questão com suas mães (estas como pessoas manipuladoras, que acabavam atrapalhando as vidas de seus filhos) e uma pessoa tinha uma questão sobre tomar uma decisão importante por conta da insegurança em relação ao futuro.
Pela semelhança dos temas das três primeiras pessoas, todos nós sabíamos que, qualquer uma delas que fosse trabalhar no palco do Psicodrama, representaria a outra. E, pela minha experiência, eu sabia que, em algum momento, a quarta pessoa entraria na história.
Cada um deu um nome para sua história, como se fosse uma manchete de jornal, e contou um pouco do que gostaria de trazer naquele grupo. A escolhida, a quem chamarei de Pati, foi “Mãe prejudica vida da filha”.
Sua primeira cena era relacionada a uma situação presente, mas por algum motivo ela diz que a cena a seguir ficava vindo à sua cabeça.
Ela tem 30 anos de idade, está em seu quarto com sua mãe a proibindo de sair com seus amigos. Ela foge. Enquanto está sozinha, peço para que pense em voz alta. Superaquecida, ela não consegue viver o momento da história, falando sobre questões do momento atual (ano de 2018). Coloco, então, uma pessoa para representa-la em 2018 (hoje com 46 anos de idade) para dialogar com a de 30 anos. Inverto as posições e peço para que a de 46 converse com a de 30, que está com medo e se sentindo insegura em relação ao seu futuro (sim, a pessoa que está representando essa Pati é aquela pessoa que trouxe uma questão de insegurança em relação ao seu futuro e a chamarei de Renata).
A Pati de 46 já se sente muito mais segura para conversar com sua mãe, que é colocada na cena. Pati começa a falar para sua mãe o que fez com ela e o quanto atrapalhou, mas que agora não queria mais se deixar influenciar pelas suas manipulações.
A pessoa que representava a mãe de Pati (que chamarei aqui de Lu) fica emocionada e se identifica com Pati. Inverto as posições, porém, peço para Lu ser ela mesma e a mãe de Pati se tornar mãe de Lu. (Gosto de intercalar as histórias quando ocorre uma identificação na cena.)
Lu começa a falar para sua mãe como se sente na relação com ela. Inverto os papéis e peço para Lu (no lugar de sua mãe) mostrar corporalmente o que faz com a filha. Esta aperta os braços de sua filha, que fica sem mobilidade e se sentindo sufocada. A cena continua e peço para que, enquanto a mãe faz o movimento corporal também vá verbalizando o que a filha pode e não pode fazer. Inverto novamente os papéis, Lu toma seu próprio lugar, e peço para que a mãe faça o movimento com as verbalizações e exagere nos movimentos. Lu vai ficando com raiva, esse sentimento vai crescendo, até que ela consegue se livrar da contenção de sua mãe. Essa mudança de comportamento (espontaneidade-criatividade) nos leva à tentativa de diálogo entre mãe e filha. Configura-se uma competição entre as duas, algo que era negado por Lu, mas que na cena fica nítido e ela acaba se responsabilizando pela competição também. Mas, o tempo todo repete que “Tenho que me dar bem com minha mãe!”. Exploro de onde vem essa crença e isso nos leva a uma conversa dela com seu pai, já falecido.
No lugar de seu pai, demonstra seu orgulho e felicidade por sua filha amá-lo mais do que à sua mãe e Lu, por sua vez, também gosta desse sentimento do pai em relação a ela, que se sente especial. Falo pra ela pedir autorização ao seu pai para que ela se dê bem com a sua mãe. Facilmente ele autoriza. Digo que isso não é real e peço para que ele fale do fundo do seu coração. Ele resiste bastante, mas acaba autorizando um pouco.
Coloco Lu em seu próprio lugar e digo para ela fazer algum movimento diferente em relação à sua mãe. Ela consegue dar um passo, mas ainda não consegue se aproximar tanto. (Vida real é assim! Não tem final feliz como nos contos de fadas.)
Volto para a cena anterior de Pati em que ela está conversando com sua mãe. Vocês sabem que o corpo fala, certo? Pois bem. Suas mãos começam a ir para o seu peito e pontuo isso. Ela diz que é para se proteger emocionalmente de sua mãe. Digo que tudo bem ela se proteger e digo que não vamos mexer nisso. Corporalmente ela começa a ir para trás se afastando de sua mãe, que fica paralisada e não faz nenhum movimento.
Não esqueço da cena inicial de Pati, que era em relação ao seu presente. Lembro-a disso e pergunto se ela já pode fazer essa mudança que ela tanto quer. Ela diz que sim e que não vai mais se prender por conta das manipulações da mãe. Inverto algumas vezes as posições para checar como está o complementar, que é a sua mãe. Pati, então, se permite ir embora, não colocando a dificuldade emocional que antes a estava fazendo questionar essa decisão.
Encerrada essa cena, coloco a própria Pati no lugar da Renata do futuro. Começamos a explorar o medo e a insegurança em relação à dificuldade de ela tomar algumas decisões para o seu futuro. Como não tem nenhuma outra pessoa que a está atrapalhando, percebo que é uma questão dela com ela mesma. Coloco as duas para firmarem um compromisso com elas mesmas de fazer algo diferente do que já fez até o momento. Ela diz que vai procurar uma ajuda profissional, mas diz que não tem grandes atitudes diferentes. Digo que isso já é um grande passo e que as coisas não são radicais, ainda mais em decisões difíceis da vida.
Encerrada essa cena, vejo que ainda temos um tempo e opto por chamar a terceira pessoa com a questão com a mãe, a quem chamarei de Paulo.
Coloco-o diante de sua mãe. Ele fica de costas pra ela. Peço para ele entrar no lugar de sua mãe e mostrar como ela faz com ele corporalmente. Ele chega bem perto e ele vai esquivando. Inverto novamente. Ele em seu próprio lugar começa a se esquivar e leva suas mãos fechadas em frente ao corpo. Pergunto o que é isso. Ele diz que quer dar um soco nela. Dou uma almofada para a pessoa que representa sua mãe e digo a ele: “Vá! Dê um soco nela!”. Ele recua e diz que não quer bater nela não. (Dependendo da situação, no Psicodrama as pessoas podem realizar o que que pensam, assumindo responsabilidade e se comprometendo com o que pensam e sentem.) Pergunto a ele se ele está protegendo sua genitália. Ele faz uma cara de insight e diz que, se bobear, ela quer casar e transar com ele.
Vale lembrar que uma das queixas de Paulo é que a mãe fica escolhendo com quem ele deve ou não namorar e casar. Esse movimento das mãos é muito simbólico.
Ao longo da cena, vou explorando como essa raiva em relação à mãe foi aparecendo e me dava uma sensação de estar faltando alguma coisa (lógico que o conhecimento teórico também ajuda nessas decisões de direção de cena). Pergunto quem deveria ter feito esse corte nessa relação construída dessa forma. Aparece a figura do pai, também falecido, no qual Paulo sentiu falta de conhece-lo melhor e de ter tido uma relação diferente, algo que também não consegue com sua mãe. Finalizamos essa cena com um pequeno-grande movimento de Paulo em relação à sua mãe: já consegue olhar de frente pra ela, suas mãos não mais protegem seu genital e eles encontram um meio termo de visita-la de vez em quando. (Ele não mora na mesma cidade que a mãe, mas vai pra lá periodicamente.)
As cenas foram fortes e compartilhamos e elaboramos as experiências ao final do Psicodrama. Um ponto importante que levantaram na elaboração era se existe uma hierarquia dentro da família, na qual os pais são “maiores” do que os filhos. Concordo com a hierarquia familiar, porém os filhos não devem ser “menores” que seus pais ou ficarem esperando que seus pais se tornem “maiores”, numa expectativa idealizada, pois dessa forma nós bloqueamos nosso crescimento na vida, afinal, os filhos vieram ao mundo para serem “melhores” que os pais. Nós é que, como filhos, acabamos sentindo necessidade de pedirmos “autorização” para crescermos e sermos “maiores” do que eles, os pais.

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