“IMOBILIDADE” – COMO FOI O “DANÇA DAS CADEIRAS: UM WORKSHOP SOBRE TRABALHO E CARREIRA”


“Eu estou num campo com uma grama verde macia. A temperatura está agradável. Bate uma brisa gostosa no rosto. Estou bem confortável. De repente, bate um vento forte e frio, mas logo passa. O vento começa a incomodar, mas como já passei por algo pior antes, eu consigo aguentar! E então aparece uma neblina, que não permite enxergar o que tem na frente.”
Assim começa a cena de Luísa, escolhida pelo grupo para ter sua história trabalhada no palco do Psicodrama. Ela está insatisfeita em seu trabalho, mas não sabe o que quer fazer e nem para onde ir.
Luísa escolhe alguém da plateia para desempenhar o papel de neblina. Vou invertendo as posições dela e dos elementos que vão aparecendo para que ela mostre como eles agem em seu corpo. A neblina cobre seus olhos no início, mas depois vira um peso nas costas, transformando-se em “incapacidade”. Ela quer sair daí, mas não consegue por conta de seu medo. Alguém da plateia vem representa-lo, fazendo um peso, uma pressão em sua cabeça.
Peço para a incapacidade e o medo fazerem esses movimentos para ver como Luísa reage. Com bastante esforço ela consegue sair disso, mas diz que é só nessa cena, pois na situação real ela não consegue sair.
Pergunto qual é a situação real. Ela traz a época em que estava na faculdade, colocando alguém para representar a entidade “faculdade”, que inicialmente aponta o dedo pra ela, mas depois vai pra cima dela, exercendo pressão, cobrança e fazendo com que ela se sinta incompetente.
Todos fazem seus movimentos corporais e peço para colocarem voz a partir desses papéis. Pergunto para onde ela quer ir e o que ela quer. Ela diz que quer: autonomia, foco e análise. Escolhe as pessoas para representar esses elementos, mas os coloca meio fora da cena. Fala que é muito cobrada em seu trabalho para que desenvolva essas características.
Ela diz que tem vontade de ir jogar um game de celular para fugir do problema.
Tiro Luísa de cena, coloco alguém em seu lugar e peço para ela ver de fora. Pergunto o que dá vontade de fazer. E ela diz que dá vontade de tirá-la desse lugar. Falo pra ela tentar, mas ela não consegue.
Dou uma explorada para ver se ela faz isso em outras situações da vida. Ela diz que não. Busco então um papel em que ela se sinta potente. Ela traz a “Luísa do bar”, que consegue falar de tudo com todo mundo, com desenvoltura. Ela escolhe alguém para representa-la e tentar ajuda-la a sair dessa situação de pressão, cobrança e incapacidade.
Também fica difícil sair da situação, já que ela tende a fugir das situações, jogando o game ou indo pro bar.
Coloco-a novamente na cena e peço para ela fechar os olhos, perceber o corpo e buscar cenas em que ela se sentiu dessa forma, jogada no chão com várias coisas pressionando.
Depois de buscar algumas cenas, ela chega em uma lembrança em que ela cai de um cavalo e um monte de gente fica em volta dela. Ela tem 15 anos. Pergunto quem está por perto, além dos desconhecidos. Ela fala que sua mãe está distante.
Ela escolhe alguém pra fazer sua mãe e inverte o papel. A própria Luísa desempenha agora o papel de sua mãe. Ela acolhe a filha e cuida dela. Falo pra Luísa (no papel de mãe) que em 2018 a filha vai estar numa situação em que ela também precisa de colo e cuidado. A mãe diz que não vai dar, pois a filha já está bem adulta e já consegue se cuidar sozinha.
Depois de um tempo de conversa, dispenso os outros elementos da cena e faço um diálogo entre mãe e filha, uma de frente pra outra. Nessa conversa, a mãe diz o que espera da filha.
Em algum momento Luísa se incomoda, acha que está sendo egoísta com o grupo, mas as pessoas dizem que estão se sentindo contempladas. Pergunto se ela quer parar nesse momento ou se ela quer continuar. Ela quer continuar.
No horizonte, colocamos o que Luísa quer: ela só sabe que quer estar na praia com muito dinheiro. Depois esse desejo vai tomando forma e ela se vê casada com uma família e dinheiro na praia.
Questiono se esse desejo é dela ou da mãe. Ela afirma que é dela e se posiciona diante da mãe.
O diálogo continua e a pessoa que está desempenhando o papel da sua mãe diz que está se identificando muito com a situação. Pergunto para as pessoas do grupo se tem mais alguém se identificando. Algumas pessoas se manifestam.
Opto então por colocar uma pessoa no papel de mãe (de qualquer uma das pessoas) e digo para quem quiser falar com sua mãe para ir até lá e falar o que pensa e sente. Esse acaba sendo o desfecho da história de Luísa, que finaliza a conversa com sua mãe, dizendo como vai seguir seu caminho. Outras pessoas também vêm falar com a mãe: desde dizer que vai seguir a profissão que quer e não a que a mãe deseja; passando pela filha que está com muita raiva de sua mãe, pois está se sentindo manipulada e sabotada; aquela que está com raiva da mãe, mas que não vai deixar mais ela manipular; a filha que já perdeu sua mãe, está com saudades e quer um abraço bem forte; a filha que agradece tudo que sua mãe fez por ela.
Articulamos essa questão da relação com a mãe que emergiu no Psicodrama com o tema de trabalho e carreira. Nosso jeito de lidar com as coisas da vida, inclusive no trabalho e nas escolhas profissionais, foi criado a partir de nossas relações, seja com mãe, pai, professor/a e buscamos os primórdios de como estamos no momento atual, a partir das cenas mais antigas. No caso de Luísa apareceu a relação com sua mãe, mas poderia ter sido qualquer outra relação de sua vida. Talvez em um outro Psicodrama apareçam outras relações, mas essa foi a história que surgiu nesse único encontro, com esse único grupo.

13 de julho de 2018
“Dança das Cadeiras: Um Workshop sobre Trabalho e Carreira”

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